quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Dinheiro público!

Matéria publicada pelo O Estado de São Paulo, dia 15 de dezembro de 2010.

Governo flagra esquema de emendas que tem até frentista como laranja

Controladoria-Geral da União (CGU) descobre que parlamentares destinaram R$ 20 milhões, desde 2008, para duas entidades fantasmas, conforme esquema já denunciado pelo ‘Estado’; uma papelaria consta como sede de um instituto

14 de dezembro de 2010 | 23h 01

Leandro Colon, de O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - Investigação recém-concluída pelo setor de inteligência da Controladoria-Geral da União (CGU) identificou um esquema envolvendo dois institutos de fachada e empresas fantasmas que usam um frentista de posto de gasolina e um motorista de caminhão como laranjas. Uma faxineira também aparece como testa de ferro nesse esquema, que levou R$ 20 milhões em emendas parlamentares liberadas pela pasta do Turismo desde 2008.

Veja também:
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Parlamentares dizem que atenderam a pedidos
Os indícios de fraude são semelhantes ao esquema descoberto e revelado pelo Estado na semana passada envolvendo os institutos Renova Brasil, Inbraest, Planalto Central, Brasil Sempre à Frente, Inbrasil, entre outros. A reportagem mostrou que uma empresa em nome de um jardineiro foi usada para lavar os recursos destinados a shows e eventos culturais. Um dos institutos, o Renova Brasil, tem sede numa vidraçaria.

Relatoria
Autor de emendas para essas entidades, o senador Gim Argello (PTB-DF) renunciou à relatoria do Orçamento na semana passada. Agora, pelo menos R$ 600 mil em emendas de Gim também aparecem para os institutos investigados pela CGU. Surgem ainda emendas do senador Marconi Perillo (PSDB-GO), dos deputados Sandro Mabel (PR-GO), Raquel Teixeira (PSDB-GO), Carlos Alberto Lereia (PSDB-GO), Luciana Costa (PR-SP), Sandes Júnior (PP-GO), e do líder do PTB, Jovair Arantes (GO), entre outros.
A investigação da controladoria será compartilhada pelo Ministério Público Federal a partir de hoje, segundo informou nesta terça-feira, 14, à reportagem o ministro da pasta, Jorge Hage.
"A CGU vai encaminhar todos os seus achados de inteligência e auditoria ao Ministério Público, para as providências de natureza cível e penal. No âmbito administrativo, o Ministério do Turismo se comprometeu a passar um pente fino nas prestações de contas’, disse. Para Hage, o caso identificado pela CGU pode ter ligação com o esquema descoberto pelo Estado.
O serviço de inteligência da CGU abriu no fim do ano passado as investigações sobre o Instituto Educar Crescer e o Premium Avança Brasil. O órgão rastreou o dinheiro nos últimos meses e chegou à empresa Conhecer Consultoria e Marketing, que recebeu os recursos dessas entidades. Duas empresas de fachada foram usadas para simular cotações de preço dentro do convênio e favorecer a subcontratação da Conhecer.
Essa empresa de "consultoria" não existe. Tem como sócios o frentista Paulo Roberto Teixeira e Silva e o motorista de caminhão Luiz Henrique Peixoto de Almeida. Nos registros da empresa, aparece o nome da auxiliar de escritório Claudia Gomes de Melo como "administradora". Para a surpresa dos investigadores, ela preside a entidade Premium Avança Brasil.
Procuração
A Conhecer Consultoria e Marketing tem ainda procuração em nome de Carolina da Rosa Quevedo, que vem a ser tesoureira do Instituto Educar e Crescer. A faxineira dessa entidade, Delania Miranda da Silva, surge nos documentos como tesoureira do Premium Avança Brasil. Os documentos da CGU apontam ainda para o envolvimento de Idalby Ramos, conhecida como Bia, ligada à família Quevedo e apontada como uma das mentoras do esquema.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Miséria brasileira ainda é grande

O Brasil não deve ser pensado pelos poucos ricos, mas pela necessidade de elevar a renda e igualdade social. De outra forma teremos um país de injustiça social e riquezas que chegam a poucos com capacidade de manter a miséria. Cabe ressaltar que os números que geram pessimismo são importantes para refletir no dia de "comemoração" da Proclamação da República.


Vale a pena analisar o comentário do articulista do Jornal Folha de S. Paulo, publicado em 15 de novembro de 2010.

FERNANDO DE BARROS E SILVA

Abaixo de R$ 140  

SÃO PAULO - Um tanque de gasolina. O preço de dois ou três livros. Um jantar razoável para duas pessoas. Tudo isso pode custar R$ 140. Pense no quanto você gastou nesses dias de feriado. Mais de 30 milhões de pessoas (15,5% da população) ainda vivem com menos de R$ 140 por mês no Brasil. Há dez anos eram 57 milhões de pessoas (33,3% da população) nessa condição.
Seria o caso de comemorar e de ter vergonha ao mesmo tempo. Dos quase 31 milhões de miseráveis, 12,4 milhões ainda são considerados "indigentes". É como são chamados, tecnicamente, aqueles que sobrevivem com renda mensal de até R$ 70. Temos alguma ideia de como é a vida dessas pessoas?
O problema, na verdade, é maior. O próprio governo reconhece, na reportagem publicada ontem pela Folha, que R$ 140 mensais per capita (que define o teto da clientela do Bolsa Família) é um valor ridiculamente baixo. A economista Lena Lavinas, da UFRJ, defende que a definição de pobreza seja reconsiderada: quem vive com menos de 60% da renda familiar média per capita (R$ 465), ou seja, com até R$ 280 mensais. No momento em que Dilma promete erradicar a miséria, seria bom aproximar um pouco a nomenclatura da realidade.
O governo Lula, no entanto, entre tantos erros e acertos, teve o grande mérito histórico de dar visibilidade aos pobres, alargando a percepção do país sobre si mesmo. Lula fez com que os pobres se vissem como portadores de direitos sociais e protagonistas da política.
A questão da miséria está colocada em novos termos no centro do debate nacional -menos do que poderia ter sido, para parte da esquerda; com os vícios do paternalismo e do clientelismo, para outros; de modo incômodo para uma fração das classes médias e altas, inconformadas com "esses nordestinos". As reações, muitas vezes antagônicas ou regressivas, sinalizam que, apesar da pasmaceira da política, algo se mexe na iníqua paisagem social brasileira.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Nova ordem para as mídias

Governo sinaliza discutir a regulamentação da mídia brasileira diante das mudanças na comunicação e o monopólio dos veículos nas mãos de poucos empresários. Além do mais, os novos meios vem tomando espaço dos tradicionais no campo econômico, sem o olhar atento da sociedade do país.


Materia publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, terça-feira, dia 9 de novembro.

Ministro defende que Dilma regule mídia

Para Franklin, área de comunicações será tema de destaque no futuro governo

Karla Mendes, de O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - Ao apresentar ontem os objetivos do Seminário Internacional das Comunicações Eletrônicas e Convergência de Mídias, que será realizado em Brasília hoje e amanhã, o ministro Franklin Martins (Comunicação Social da Presidência) disse ser "um absurdo" que os artigos sobre comunicação na Constituição estejam há duas décadas esperando pela regulamentação. Para ele, o marco regulatório do setor, de 1962, é incompatível com a nova realidade do País.
"Ou olha para frente ou a ‘jamanta’ das telecomunicações atropela a radiodifusão", afirmou Franklin Martins. O ministro fez uma comparação entre setores: enquanto as empresas de radiodifusão faturaram R$ 13 bilhões em 2009, as de telecomunicações embolsaram a receita de R$ 180 bilhões.
O ministro disse que a presidente eleita, Dilma Rousseff, receberá até meados de dezembro um anteprojeto da revisão do marco regulatório das telecomunicações, que tratará também da convergência de mídias.
"Será uma proposta de regulação flexível, porque a velocidade das transformações tecnológicas nessa área aconselha que se seja pouco rígido e pouco detalhista na lei, (uma vez que) as tecnologias e ambientes de negócios vão mudando. O essencial é que traga os princípios gerais, liberdade de informação, neutralidade, estímulo à competição e à inovação, proteção à cultura nacional, regional", ressaltou.
Ele não quis adiantar detalhes do projeto, como, por exemplo, se o Brasil seguirá o caminho de países que optaram pela criação de duas agências reguladoras - uma para tratar dos aspectos técnicos dos meios eletrônicos e outra voltada para conteúdo - ou se os dois assuntos serão tratados dentro de uma única agência.
Censura
Franklin Martins fez questão de frisar que a regulação do conteúdo não tem nada a ver com censura da imprensa. "Sou contra a censura. E o governo também. Não deve haver na sociedade censura alguma à imprensa. Sou contra, inclusive, o Judiciário censurar a imprensa", enfatizou. O ministro defendeu que a imprensa tenha total liberdade, mas ponderou que isso não quer dizer que "a imprensa está acima da crítica".
Segundo o ministro, o anteprojeto também vai propor a regulamentação dos artigos da Constituição que tratam de produção nacional, regional e independente (220, 221 e 222). "É absurdo que, 22 anos depois (da promulgação da Constituição), artigos que dependem de regulamentação não sejam regulamentados."
A participação de capital estrangeiro nas empresas do setor, no entanto, somente será debatida se a discussão for provocada pelo público. "Já existe uma lei que regulamenta isso", defendeu o ministro.
Na opinião de Franklin Martins, as fronteiras entre telecomunicações e radiodifusão estão sendo postas em xeque pela convergência de mídias na divulgação do conteúdo e, por isso, é uma questão que tem de passar por um amplo debate com a sociedade. "Só assim poderemos transformar os desafios e as possibilidades em crescimento."
Três caminhos
Caberá à presidente eleita dar prosseguimento ou não às propostas apresentadas. Dilma tem três caminhos a escolher. O primeiro: deixar que o próprio presidente Lula tome a decisão e encaminhe o projeto ao Congresso Nacional. A segunda opção é fazer esse encaminhamento durante a nova gestão; ou ainda, definir por não levá-lo adiante. O ministro Franklin Martins, no entanto, demonstrou otimismo quanto à hipótese de as propostas serem encaminhadas, discutidas e transformadas em lei.
"Da mesma forma que, no primeiro mandato do governo Lula, foi fundamental ter um novo marco regulatório na questão da energia para impedir novos apagões, acho que as comunicações terão um destaque semelhante (no governo Dilma)", enfatizou Franklin Martins. "É necessário que se tenha um novo marco regulatório que dê segurança aos investidores, possibilidade de competição, que permita a inovação, que garanta os direitos dos cidadãos e que promova uma grande oferta de informações e conhecimentos, ingredientes vitais para o exercício da cidadania", defendeu.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Mídia em debate

Volta o debate social sobre a formação dos conselhos de comunicação que será responsável pela acompanhamento dos meios de comunicação, com iniciativa de alguns estados brasileiros. A idéia não é nova, pois apesar da resistência da empresas, a discussão está em voga por longo período, entretanto, sempre impedido de tramitar no congresso nacional.

A conferência de Nacional de Comunicação (Confecom), a qual em reuniu pessoas ligadas a sociedade civil, profissionais e empresas entenderam a necessidade trabalhar para a qualidade da informação do país, concentrada nas mãos de poucos empresários que mantém conglomerado de mídias.


Texto publicado pelo Jornal Folha de S. Paulo, segunda, 25 de outubro de 2010.

Mais 3 Estados têm projetos para monitorar a mídia Depois de CE, BA, AL e PI se preparam para implantar órgãos de controle

Entidade de empresas de rádio e TV teme que objetivo seja simular "clamor para justificar" criação de órgão federal

ELVIRA LOBATO
DO RIO

Ao menos mais três Estados -Bahia, Alagoas e Piauí- preparam-se para implantar conselhos de comunicação com o propósito de monitorar a mídia.
A criação dos conselhos foi recomendação da Conferência Nacional de Comunicação, realizada no ano passado, por convocação do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O Ceará foi o primeiro a tomar a iniciativa. Na terça-feira, a Assembleia Legislativa do Estado aprovou a criação de um conselho, vinculado à Casa Civil, com a função de "orientar", "fiscalizar", "monitorar" e "produzir relatórios" sobre a atividade dos meios de comunicação, em suas diversas modalidades.
O governo de Alagoas estuda transformar um conselho consultivo - existente desde 2001 e pouco operante- em deliberativo, com poder de decisão semelhante ao aprovado pelo Ceará.
A modificação foi proposta pelo conselho atual e será examinada pela Casa Civil e pela Procuradoria-Geral do Estado. O governador é Teotonio Vilela Filho (PSDB).
Segundo o presidente do conselho, Marcos Guimarães, entre as novas funções estaria o monitoramento da programação da mídia.
"Não podemos cruzar os braços. Nem tudo que vai ao ar é agradável à sociedade alagoana", afirmou.
Ele diz que o conselho atual já exerce, de certa forma, esse papel.
"Se um programa agride o cidadão, o conselho recomenda à empresa que o modifique, mas ela não tem obrigação de acatar a sugestão, porque ele é só consultivo. Quando for deliberativo, poderá tomar medidas efetivas, respeitando a legislação das concessões", afirmou.
No Piauí, foi proposta a criação de conselho com atribuição de denunciar às autoridades "atitudes preconceituosas de gênero, sexo, raça, credo e classe social" das empresas de comunicação.
Caberia ainda a esse conselho vigiar o cumprimento das normas de radiodifusão pelas emissoras locais e de denunciá-las à Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) e ao Ministério das Comunicações em caso de desrespeito à legislação.
O projeto foi feito por um grupo de trabalho nomeado pelo ex-governador Wellington Dias (PT) e encaminhado à Assembleia Legislativa.
Na Bahia, o conselho seria vinculado à Secretaria de Comunicação Social do Estado. A minuta do regulamento do conselho foi feita por um grupo de trabalho constituído em novembro do ano passado pelo governador Jaques Wagner (PT), que foi reeleito.
O secretário de Comunicação, Robinson Almeida, negou que haja intenção do governo do Estado de cercear a imprensa. Disse que o projeto está em análise na Casa Civil e não será divulgado antes de passar pelo crivo jurídico.
Além desses três Estados, em que há envolvimento direto do Executivo, tramita em São Paulo projeto semelhante ao aprovado no Ceará, como revelou o Painel ontem.
O texto do líder do PT, Antonio Mentor, prevê a criação de conselho parlamentar que teria, entre outras funções, a de fiscalizar as outorgas e concessões de rádio e TV.

FALTA DE COMPETÊNCIA
O diretor-geral da Abert (Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão), Luís Roberto Antonik, chama a atenção para o fato de que Estados não têm competência para regular a atuação da mídia.
A Abert teme que o movimento em vários Estados vise simular um "clamor para justificar o governo federal propor o controle social sobre a mídia". De acordo com ele, a entidade ainda está analisando as medidas a tomar para evitar que o movimento prospere. "Tutelar a mídia é um retrocesso que o Brasil não merece", afirmou.
O presidente da Alert (Associação Alagoana de Emissoras de Rádio e Televisão) e diretor da Rádio Gazeta, Gilberto Lima, que integra o conselho consultivo existente no Estado, disse que, para o órgão ganhar poder, o estatuto tem de ser mudado.
Ele disse que votará contra cláusulas que permitam o cerceamento da mídia.

Valor do voto dos pobres

Com muito tempo de atraso. Mas um bom texto deve ser preservado por tempo suficiente para fazer lembrar determinados debates que são importantes na sociedade. Ainda mais que os casos de injustiça no Brasil perduram por séculos e precisam ser, no mínimo, discutidos.

Abaixo o artigo da Psicanalista Maria Rita Khel, que faz dura crítica a exclusão social, o qual rendeu-lhe demissão do Jornal Estado de São Paulo que, em editorial, defendeu apoio da empresa ao candidato do PSDB José Serra, ainda no primeiro turno. 

A publicação foi feita em 02 de outubro de 2010, portanto, um dia antes das eleições do primeiro turno, sábado, no próprio Estado de São Paulo.

DOIS PESOS…
Maria Rita Khel

Este jornal teve uma atitude que considero digna: explicitou aos leitores que apoia o candidato Serra na presente eleição. Fica assim mais honesta a discussão que se faz em suas páginas. O debate eleitoral que nos conduzirá às urnas amanhã está acirrado. Eleitores se declaram exaustos e desiludidos com o vale-tudo que marcou a disputa pela Presidência da República. As campanhas, transformadas em espetáculo televisivo, não convencem mais ninguém. Apesar disso, alguma coisa importante está em jogo este ano. Parece até que temos luta de classes no Brasil: esta que muitos acreditam ter sido soterrada pelos últimos tijolos do Muro de Berlim. Na TV a briga é maquiada, mas na internet o jogo é duro.
Se o povão das chamadas classes D e E – os que vivem nos grotões perdidos do interior do Brasil – tivesse acesso à internet, talvez se revoltasse contra as inúmeras correntes de mensagens que desqualificam seus votos. O argumento já é familiar ao leitor: os votos dos pobres a favor da continuidade das políticas sociais implantadas durante oito anos de governo Lula não valem tanto quanto os nossos. Não são expressão consciente de vontade política. Teriam sido comprados ao preço do que parte da oposição chama de bolsa-esmola.
Uma dessas correntes chegou à minha caixa postal vinda de diversos destinatários. Reproduzia a denúncia feita por “uma prima” do autor, residente em Fortaleza. A denunciante, indignada com a indolência dos trabalhadores não qualificados de sua cidade, queixava-se de que ninguém mais queria ocupar a vaga de porteiro do prédio onde mora. Os candidatos naturais ao emprego preferiam viver na moleza, com o dinheiro da Bolsa-Família. Ora, essa. A que ponto chegamos. Não se fazem mais pés de chinelo como antigamente. Onde foram parar os verdadeiros humildes de quem o patronato cordial tanto gostava, capazes de trabalhar bem mais que as oito horas regulamentares por uma miséria? Sim, porque é curioso que ninguém tenha questionado o valor do salário oferecido pelo condomínio da capital cearense. A troca do emprego pela Bolsa-Família só seria vantajosa para os supostos espertalhões, preguiçosos e aproveitadores se o salário oferecido fosse inconstitucional: mais baixo do que metade do mínimo. R$ 200 é o valor máximo a que chega a soma de todos os benefícios do governo para quem tem mais de três filhos, com a condição de mantê-los na escola.
Outra denúncia indignada que corre pela internet é a de que na cidade do interior do Piauí onde vivem os parentes da empregada de algum paulistano, todos os moradores vivem do dinheiro dos programas do governo. Se for verdade, é estarrecedor imaginar do que viviam antes disso. Passava-se fome, na certa, como no assustador Garapa, filme de José Padilha. Passava-se fome todos os dias. Continuam pobres as famílias abaixo da classe C que hoje recebem a bolsa, somada ao dinheirinho de alguma aposentadoria. Só que agora comem. Alguns já conseguem até produzir e vender para outros que também começaram a comprar o que comer. O economista Paul Singer informa que, nas cidades pequenas, essa pouca entrada de dinheiro tem um efeito surpreendente sobre a economia local. A Bolsa-Família, acreditem se quiserem, proporciona as condições de consumo capazes de gerar empregos. O voto da turma da “esmolinha” é político e revela consciência de classe recém-adquirida.
O Brasil mudou nesse ponto. Mas ao contrário do que pensam os indignados da internet, mudou para melhor. Se até pouco tempo alguns empregadores costumavam contratar, por menos de um salário mínimo, pessoas sem alternativa de trabalho e sem consciência de seus direitos, hoje não é tão fácil encontrar quem aceite trabalhar nessas condições. Vale mais tentar a vida a partir da Bolsa-Família, que apesar de modesta, reduziu de 12% para 4,8% a faixa de população em estado de pobreza extrema. Será que o leitor paulistano tem ideia de quanto é preciso ser pobre, para sair dessa faixa por uma diferença de R$ 200? Quando o Estado começa a garantir alguns direitos mínimos à população, esta se politiza e passa a exigir que eles sejam cumpridos. Um amigo chamou esse efeito de “acumulação primitiva de democracia”.
Mas parece que o voto dessa gente ainda desperta o argumento de que os brasileiros, como na inesquecível observação de Pelé, não estão preparados para votar. Nem todos, é claro. Depois do segundo turno de 2006, o sociólogo Hélio Jaguaribe escreveu que os 60% de brasileiros que votaram em Lula teriam levado em conta apenas seus próprios interesses, enquanto os outros 40% de supostos eleitores instruídos pensavam nos interesses do País. Jaguaribe só não explicou como foi possível que o Brasil, dirigido pela elite instruída que se preocupava com os interesses de todos, tenha chegado ao terceiro milênio contando com 60% de sua população tão inculta a ponto de seu voto ser desqualificado como pouco republicano.
Agora que os mais pobres conseguiram levantar a cabeça acima da linha da mendicância e da dependência das relações de favor que sempre caracterizaram as políticas locais pelo interior do País, dizem que votar em causa própria não vale. Quando, pela primeira vez, os sem-cidadania conquistaram direitos mínimos que desejam preservar pela via democrática, parte dos cidadãos que se consideram classe A vem a público desqualificar a seriedade de seus votos.

sábado, 23 de outubro de 2010

Colômbia desiste de acordo com EUA

Uma boa notícia para a América Latina a desistência da Colômbia de acordo com os Estados Unidos para uso de bases militares no país. Afinal, a região ganhou muita importância no cenário econômico e ambiental e não pode se ver como quintal da nação norte-americana. 


Matéria publica pelo jornal Folha de S. Paulo, sábado, dia 23 de outubro de 2010.

Colômbia desistiu de acordo com os EUA, afirma senadora
Segundo parlamentar, presidente Santos não permitirá o uso de bases militares
FLÁVIA MARREIRO
DE CARACAS
O governo da Colômbia teria desistido do acordo militar que permitiria aos EUA usar até sete bases no país.
A informação, sobre a qual a Presidência não se pronunciou, foi dada pela vice-presidente do Senado colombiano, Alexandra Moreno.
De acordo com ela, o governo não mais enviará projeto de lei ao Congresso a respeito dos uso das bases.
Em agosto, a Corte Constitucional na Colômbia determinou que o tratado, assinado no ano passado, ficasse "sem efeito" até ser aprovado pelo Parlamento -passo que tanto o governo colombiano como Washington negavam ser necessário.
Moreno disse à agência de notícias Efe que o presidente colombiano, Juan Manuel Santos, informou à sua bancada que "vai deixar quieto" o acordo e "não vai propor" sua tramitação.
A senadora foi a primeira governista a ser taxativa sobre o tema, mas tanto o ministro do Interior, Germán Vargas Lleras, como Santos já haviam sinalizado que o tratado "essencial" para o governo de seu antecessor, Álvaro Uribe, é uma dúvida neste momento.
No final de agosto, o "Washington Post" publicou que fontes ligadas a Santos afirmaram que o governo "tende" a deixar o acordo morrer.
O problema não está na aprovação do Congresso, onde Santos tem ampla maioria, mas no impacto do debate do tema para as relações recém-retomadas com a Venezuela. Outro problema é a Corte Constitucional.
Se aprovado pelo Parlamento, o tratado volta mais uma vez ao tribunal, dessa vez para a avaliação do mérito. Segundo a reportagem apurou, o governo Santos ainda espera conhecer todos os detalhes da primeira sentença da corte.
Os EUA têm minimizado os efeitos da suspensão do tratado. O maior interesse do Pentágono era na utilização da base área de Palanquero, no centro do país, para o qual o Congresso americano já aprovou US$ 46 milhões.
O ato de aprovação do acordo frisa que nenhum recurso pode ser utilizado até que os países cheguem a "um acordo" que permita ao Comando Sul realizar toda sua "estratégia anti-drogas".
Segundo analistas, Washington pode decidir levar adiante o investimento nas bases usando verba de outras fontes.
Além de Palanquero, a suspensão do tratado também tira dos militares e contratistas americanos outras vantagens obtidas na negociação com Uribe, como imunidade diplomática até para familiares e porte de arma.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Intelectuais manifestam apoio a Dilma

Afastados diretamente da política alguns intelectuais resolverem participar da campanha eleitoral e fazem manisfesto em apoio a candidata petista. Em silêncio muitos deles soltaram a voz o tucano José Serra e o sistema liberal de governo.

Matéria publicada terça-feira, pelo jornal O Estado de São Paulo, em 19 de outubro de 2010.

Intelectuais e artistas se unem em ato pró-Dilma

Oscar Niemeyer, Chico Buarque e várias personalidades viveram um clima de volta ao passado, como na campanha de Lula em 1989


Luciana Nunes Leal e Marcelo Auler

Volta ao passado. Personalidades da música, da política, atores e intelectuais se encontraram no Teatro Casa Grande para dar apoio a candidata petista à Presidência da República como foi feito na campanha de Lula
RIO - Com a rara presença do cantor e compositor Chico Buarque de Hollanda, que só perdeu em aplausos para o arquiteto Oscar Niemeyer, mais de mil artistas, intelectuais e militantes reuniram-se ontem em um ato em apoio à candidata do PT à Presidência da República, Dilma Rousseff, no Teatro Casa Grande, tradicional ponto de encontro e espetáculos da esquerda carioca, na zona sul do Rio. Os manifestantes entregaram à Dilma um documento com mais de 10 mil assinaturas, muitas delas de eleitores de Marina Silva (PV) e Plínio de Arruda Sampaio (PSOL), no primeiro turno.
Chico Buarque fez um rápido pronunciamento com elogios à Dilma e ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Essa mulher de fibra, que já passou por tudo, não tem medo de nada. Vai herdar o senso de justiça social, um marco do governo Lula, um governo que não corteja os poderosos de sempre, não despreza os sem-terra, os professores, garis. Um governo que fala de igual para igual com todos, que não fala fino com Washington, nem fala grosso com a Bolívia e o Paraguai", disse Chico, muito aplaudido pela plateia. Antes de falar, Chico mostrou-se surpreso: "Pensei que fosse ficar apenas como papagaio de pirata do Boff", brincou.


A presença de Niemeyer, de 102 anos, que chegou em cadeira de rodas e ficou durante todo o ato público no palco, foi saudada, entre muitos outros, pelo teólogo Leonardo Boff: "Hoje pela manhã eu pedi um sinal a Deus. Se Oscar Niemeyer for ao encontro será um sinal infalível que a vitória está garantida", contou. Neste momento, o arquiteto foi ovacionado pela plateia que gritava seu nome. Boff, citou a solidariedade como uma marca do governo Lula que será mantida por Dilma Rousseff, se for eleita.
O teólogo também fez uma referência indireta à onda de informações sobre um suposto apoio de Dilma à legalização do aborto e rejeição à união civil de homossexuais. "Se com Lula a esperança venceu o medo, com Dilma a verdade vai vencer a mentira", afirmou Boff. Em referência ao candidato do PSDB José Serra, Boff afirmou que "o projeto que se articula com a privatização e com os negócios encurta a população brasileira e não podemos permitir que ele volte".

Entre os artistas presentes estavam as cantoras Alcione e Beth Carvalho, os atores Osmar Prado e Paulo Betti, os diretores José Celso Martinez Corrêa e Ruy Guerra e os escritores Fernando Morais e Eric Nepomuceno. Foram também à manifestação, os ex-ministros Márcio Thomaz Bastos, Humberto Costa, Edson Santos e os atuais José Gomes Temporão, Nilcéa Freira e Juca Ferreira.
No Teatro Casa Grande, os manifestantes viveram um clima de volta ao passado, relembrando grandes encontros de artistas em torno do petista Luiz Inácio Lula da Silva, ocorrido nas campanhas desde 1989 até a vitória em 2002. Dilma foi aclamada com adaptações de velhos jingles como "Olê, olê, olá, Dilma, Dilma".
Em seu discurso, Dilma procurou marcar as diferenças de sua candidatura e a de Serra: "Nós não achamos que crescimento social é uma alegoria de mão ou um anexo. É isso que nos distingue radicalmente dos nossos adversários", afirmou. Dilma insistiu no discurso de que os tucanos retomariam o processo de privatização se voltassem ao poder. "O que está em questão nessa eleição é o que eles farão com o pré-sal e também com a Petrobrás. A Petrobrás (no governo Fernando Henrique Cardoso) era para ser partida, esquartejada e ter suas partes vendidas", disse.
A candidata exaltou como característica do povo "a capacidade de conviver com a diversidade religiosa e racial". "Não somos um país que desfila ódio", discursou Dilma. A candidata disse que 28 milhões de pessoas saíram da pobreza no governo Lula. "Não é um dado que pode ser alvo de disputa eleitoral".
Além do manifesto de artistas e intelectuais, a petista Dilma Rousseff recebeu outros dois documentos de apoio à sua candidatura - um organizado por advogados e outro por religiosos.

domingo, 17 de outubro de 2010

MEMÓRIA E ELEIÇÕES

A revista Istoé, com capa sobre de crítica contra José Serra (PSDB), repete a fórmula empregada pela Veja que denuncia declarações contraditória de Dilma Rousseff (PT). 

Se a petista muda de opinião sobre a descriminalização de aborto, o tucano diz desconhecer dirigente estatal que sumiu com dinheiro de campanha nestas eleições. Como afirma o semanário, Paulo Preto é uma figura que constrange o partido e a forma como o candidato o trata sugere desejo do grupo serrista de esconder transações com dinheiro público paulista.

Texto publicado pela Istoé, domingo, dia 17 de outubro de 2010.

O poderoso Paulo Preto

O homem acusado pelo PSDB de dar sumiço em R$ 4 milhões da campanha tucana faz ameaças e passa a ser defendido por Serra

Sérgio Pardellas e Claudio Dantas Sequeira
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INAUGURAÇÃO DO RODOANEL
Serra aparece em foto de 30 de março de 2010 junto com
Paulo Preto, que meses mais tarde alegou não conhecer
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Como candidato à Presidência da República, José Serra deve explicações mais detalhadas à sociedade brasileira. Elas se referem a um nome umbilicalmente ligado à cúpula do PSDB, mas de pouca exposição pública até dois meses atrás: Paulo Vieira de Souza, conhecido dentro das hostes tucanas como Paulo Preto. Desde que a candidata do PT, Dilma Rousseff, pronunciou o nome de Paulo Preto no debate realizado pela Rede Bandeirantes no domingo 10, Serra se viu envolvido em um enredo de contradições e mistério do qual vinha se esquivando desde agosto passado, quando ISTOÉ publicou denúncia segundo a qual o engenheiro Paulo Souza, ex-diretor da estatal Dersa na gestão tucana em São Paulo, era acusado por líderes do seu próprio partido de desaparecer com pelo menos R$ 4 milhões arrecadados de forma ilegal para a campanha eleitoral do PSDB. Na época, a reportagem baseou-se em entrevistas, várias delas gravadas, com 13 dos principais dirigentes tucanos, que apontavam o dedo na direção de Souza para explicar a minguada arrecadação que a candidatura de Serra obtivera até então. Depois de publicada a denúncia, o engenheiro disparou telefonemas para vários líderes, dois deles com cargos no comando da campanha presidencial, e, apesar da gravidade das acusações, os tucanos não se manifestaram, numa clara opção por abafar o assunto. O próprio presidenciável Serra optou pelo silêncio. Então, mesmo com problemas de caixa e reclamações de falta de recursos se espalhando pelos diretórios regionais, o PSDB preferiu jogar o assunto para debaixo do tapete.

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No debate da Rede Bandeirantes, Serra mais uma vez silenciou. Instado por Dilma a falar sobre o envolvimento de Paulo Preto no escândalo do sumiço da dinheirama, não respondeu. Mas o pavio de um tema explosivo estava aceso e Serra passou a ser questionado pela imprensa em cada evento que participou. E, quando ele falou, se contradisse, apresentando versões diametralmente diferentes em um período de 24 horas. Na segunda-feira 11, em Goiânia (GO), em sua primeira manifestação sobre o caso, o candidato do PSDB negou conhecer o engenheiro. “Não sei quem é o Paulo Preto. Nunca ouvi falar. Ele foi um factoide criado para que vocês (jornalistas) fiquem perguntando.” A declaração provocou uma reação imediata. Na terça-feira 12, a “Folha de S.Paulo” publicou uma entrevista em que o engenheiro, oficialmente um desconhecido para Serra, fazia ameaças ao candidato tucano. “Ele (Serra) me conhece muito bem. Até por uma questão de satisfação ao País, ele tem que responder. Não se larga um líder ferido na estrada a troco de nada. Não cometam este erro”, disparou Paulo Preto. Serra demonstrou ter acusado o golpe. Horas depois da publicação da entrevista, em evento em Aparecida (SP), o candidato recuou. Com memória renovada, saiu em defesa do ex-diretor do Dersa. Como se jamais tivesse tratado deste assunto antes, Serra afirmou: “Evidente que eu sabia do trabalho do Paulo Souza, que é considerado uma pessoa muito competente e ganhou até o prêmio de engenheiro do ano. A acusação contra ele é injusta. Ele é totalmente inocente. Nunca recebi nenhuma acusação a respeito dele durante sua atuação no governo”. Aos eleitores, restou uma dúvida: em qual Serra o eleitor deve acreditar? Naquele que diz não conhecer o engenheiro ou naquele que elogia o profissional acusado pelo próprio PSDB de desviar R$ 4 mihões da campanha? As idas e vindas de Serra suscitam outras questões relevantes às vésperas do segundo turno das eleições presidenciais: por que o tema lhe causou tanto constrangimento? O que Serra teria a temer para, em menos de 24 horas, se expor publicamente emitindo opiniões tão distintas sobre o mesmo tema?
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Ainda está envolto em mistério o que Paulo Preto teria na manga para emparedar Serra. A movimentação do engenheiro nas horas que sucederam o debate da Rede Bandeirantes mostra claramente como ele é influente, poderoso e temido nas hostes tucanas. Conforme apurou ISTOÉ, logo depois do programa, Paulo Preto, bastante irritado por não ter sido defendido pelo candidato do PSDB, começou a telefonar para integrantes do partido. Um deles, seu padrinho político, o ex-chefe da Casa Civil de São Paulo, senador eleito Aloysio Nunes Ferreira, que deixou o debate logo que o nome do engenheiro foi mencionado. Outras duas chamadas, ainda de madrugada, foram para as residências de um secretário do governo paulista e de um dos coordenadores da campanha de Serra em São Paulo. Nas conversas, Paulo Preto disse que não ia admitir ser abandonado pelo partido. E que iria “abrir o verbo”, caso continuasse apanhando sozinho. Com a defesa de Serra, alcançou o que queria. Para os dirigentes do partido restou o enorme desconforto de passarem o resto da semana promovendo contorcionismos verbais para defender as ações de um personagem que acusavam dois meses antes. Em agosto, o PSDB vivia outro momento político, vários líderes tucanos reclamavam do estilo “centralizador e arrogante” de Serra, tinham dificuldades para arrecadar recursos e vislumbravam uma iminente derrota nas urnas. Agora, disputando o segundo turno e sob a ameaça de Paulo Preto, promovem uma ação orquestrada para procurar desqualificar as denúncias que eles próprios fizeram. “Às vésperas da eleição podemos ganhar o jogo. Portanto, não vou dizer nada a respeito do Paulo Preto”, disse uma das principais lideranças do partido na noite da quarta-feira 13. Esse mesmo tucano, em agosto, revelara detalhes sobre a atuação do engenheiro na obra do trecho sul do rodoanel. “Não é hora de remexer com o Paulo Preto. Isso poderá colocar em risco nossa vitória”, afirmou na manhã da quinta-feira 14 um membro da Executiva Nacional do partido, que em agosto acusara o engenheiro de desviar R$ 4 milhões da campanha. “Em agosto, depois da reportagem de ISTOÉ, procuramos empresários e eles negaram que Paulo Preto tenha pedido contribuições”, disse o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE). Se fez de fato esse movimento, Guerra não teve pressa em revelá-lo. Só foi fazê-lo agora, pressionado pelas declarações do engenheiro.
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Diferentemente do que alegou Serra em sua primeira declaração, Paulo Preto está longe de ser um desconhecido, principalmente nas altas esferas do PSDB. Ele já havia sido alvo de reportagens de veículos como “Veja” (que o chamou de “o homem-bomba do PSDB”) e “Folha de S.Paulo” (leia quadro na pág. 40). Para um político que se apresenta como um gestor atento a todos os movimentos de seus comandados, é difícil crer que o então governador Serra estivesse alheio a notícias envolvendo um dirigente da estatal que executa as principais obras do governo paulista. Além disso, Serra não pode afirmar não ter sido alertado sobre os métodos do engenheiro. Em novembro do ano passado, em e-mail enviado ao então governador Serra, o vice Alberto Goldman já dizia que o ex-diretor do Dersa era “incontrolável”. “Ele (Paulo Preto) é vaidoso e arrogante. Fala mais do que deve, sempre. Parece que ninguém consegue controlá-lo. Julga-se o super-homem.” A mensagem eletrônica também foi remetida ao secretário de Transportes, Mauro Arce, a quem o Dersa é subordinado. “Não tenho qualquer poder de barrar ações. Mas tenho o direito, e a obrigação, de opinar e tentar evitar desgastes desnecessários”, ponderou Goldman. Os e-mails deixam claro que não estava se falando sobre um funcionário qualquer do governo. Afinal, não é corriqueiro um vice-governador perder tempo discutindo com o governador do maior Estado do País a atuação do funcionário de uma estatal.

Além dos e-mails de Goldman a Serra, as atividades do engenheiro já haviam espantado o tesoureiro-adjunto e ex-secretário-geral do partido, Evandro Losacco. Na reportagem de ISTOÉ, publicada em agosto, Losacco reconheceu que o engenheiro tinha “poder” para arrecadar e confirmou o sumiço dos R$ 4 milhões. “Todo mundo já sabia disso há muito tempo. Essa arrecadação foi puramente pessoal, mas só faz isso quem tem poder de interferir em alguma coisa. Poder infelizmente ele tinha.” O “empresariado”, segundo Losacco, entendia que Paulo Preto “tem a caneta”. “No governo às vezes você não consegue fazer tudo o que você quer. Você tem contingências que o obrigam a engolir sapo. E eu acho que esse deve ter sido o caso”, disse Losacco na ocasião.
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Apesar dos alertas de Goldman, Paulo Preto ficou no cargo até abril deste ano, tocando a principal obra de São Paulo, o rodoanel. Só foi exonerado quando o próprio Goldman assumiu o governo. Se Serra não explica o porquê da permanência de Paulo Preto à frente da estatal, o próprio ex-diretor do Dersa, na entrevista à “Folha”, fornece alguns dados importantes. Paulo Preto disse que sempre criou as melhores condições para que houvesse aporte de recursos em campanhas, por ter feito os pagamentos em dia às empreiteiras terceirizadas que atuaram nas grandes obras de São Paulo, como o rodoanel, a avenida Jacu-Pêssego e a ampliação da Marginal. “Ninguém nesse governo deu condições de as empresas apoiarem mais recursos politicamente do que eu”, afirmou Paulo Preto. De fato, Paulo Preto teve um peso enorme na gestão tucana em São Paulo. Os contratos administrados pelo engenheiro estavam entre as principais obras do País, somando R$ 6,5 bilhões. De acordo com relatório do TCU, obtido por ISTOÉ, o ex-diretor chegou a pagar às empreiteiras não apenas no prazo, mas também de maneira antecipada. Os auditores do tribunal recomendaram ajustes ao que consideram uma conduta indevida de Paulo Preto, pois sempre há o risco de as empresas receberem todo o pagamento sem garantias de cumprimento das obras.

Nesse enredo nebuloso também chama a atenção o patrimônio milionário do engenheiro. Na declaração de bens de 2009, Paulo Vieira de Souza diz possuir um patrimônio avaliado em R$ 3,4 milhões, sendo R$ 560 mil referentes a imóveis. Dois anos antes, declarou em seu nome um apartamento, três casas e mais três terrenos localizados em áreas nobres das cidades de Campos do Jordão e Ubatuba, num total de R$ 2 milhões, além de um hotel-fazenda. Os valores não estão atualizados, como permite a legislação do Imposto de Renda. Só o apartamento de Paulo Vieira, com 550 metros quadrados, no edifício Conde de Oxford, situado à rua Domingos Fernandes, na Vila Nova Conceição, vale pelo menos R$ 5 milhões, de acordo com corretores. O jeito esbanjador de Paulo Vieira de Souza é apontado por amigos e ex-colegas de trabalho como seu calcanhar de aquiles. Na comemoração de seu aniversário, em 7 de março do ano passado, ele deu uma megafesta na Casa das Caldeiras, uma exclusiva área de eventos em São Paulo. Com motivos árabes, os convidados, inclusive vários tucanos de alta plumagem, se deliciaram com danças de odaliscas e passeios de camelo. A quem quisesse ouvir, Paulo dizia que desembolsou nada menos que R$ 1 milhão com a recepção.

A gestão do orçamento milionário que estava a cargo de Paulo Preto levanta ainda outras suspeitas. Preocupada com o destino desse dinheiro, a bancada do PT na Assembleia Legislativa de São Paulo entrou com uma representação no Ministério Público paulista, na tarde da quinta-feira 14, pedindo uma investigação completa. Embora não conste da representação entregue pelo deputado José Mentor ao Ministério Público, uma equipe técnica do PT está debruçada em duas frentes principais de investigação. A primeira busca checar se houve desvio de verbas no rodoanel, com o suposto uso de material de baixa qualidade a preços superfaturados. “Não é possível que uma obra inaugurada há seis meses já precise de reparos, como os que vemos ao longo do trecho sul. Além disso, quando se anda a 80 quilômetros por hora o carro trepida como se estivéssemos numa estrada de terra”, questiona um petista. A desconfiança também recai sobre o processo de desapropriação de imóveis ao longo do anel viário. “Temos informação de que muitas propriedades e terrenos foram renegociados várias vezes”, acrescenta o mesmo parlamentar. Confirmados os indícios que pesam contra Paulo Preto, o PT paulista trabalhará para instalar uma CPI a fim de apurar o caso ainda mais a fundo.
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Seguindo o espírito dos correligionários, que se calaram, Serra argumentou que Dilma, ao trazer o episódio à tona, está se preocupando com uma questão interna das finanças do PSDB, enquanto o caso da Casa Civil envolvia dinheiro público. Isto não é verdade. As arrecadações feitas por Paulo Preto e denunciadas pelo próprio PSDB só se realizaram em razão de obras públicas, financiadas com dinheiro do contribuinte. Além disso, o desvio, se comprovado, caracterizaria a prática criminosa de caixa 2 eleitoral. Por isso, o silêncio, nesses casos, é conveniente tanto para quem arrecadou quanto para as empresas que contribuíram. Há, ainda, indícios de que ele praticava tráfico de influência, já que contratou o escritório Edgard Leite Advogados Associados, banca em que trabalha a sua filha, Priscila Arana. “Paulo Preto contratou a própria filha para defender o Dersa, ao mesmo tempo que advogava para as construtoras. É um aberração, já que era o engenheiro que liberava o dinheiro paras as empresas clientes da filha e do governo”, denuncia o deputado Mentor (PT). Parte das empresas que supostamente fizeram as doações para a campanha do PSDB é representada pelo escritório onde a filha do engenheiro trabalha. “O escritório presta serviço, há mais de dez anos, a praticamente todas as empresas privadas que compõem os consórcios contratados para a execução do trecho sul do rodoanel”, afirma Edgard Leite Advogados em e-mail enviado à ISTOÉ. Mesmo assim, ele alega que são “inconsistentes e maldosas as tentativas de vincular o nome do escritório com qualquer ilicitude”. Os advogados confirmam ainda que a filha de Paulo Preto é funcionária da empresa desde 2006, ano em que o engenheiro assumiu o cargo de direção do Dersa. Sobre a defesa da empresa pública, o escritório diz que “jamais foi contratado pelo Dersa”. Não é, entretanto, o que mostra o processo judicial TC-011868/2007-6 sobre uma disputa jurídica entre o DNIT e o Dersa. Na peça, o nome de Priscila Arana aparece como advogada constituída para defender a estatal.
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Ao longo da campanha presidencial, o candidato do PSDB, José Serra, tem mostrado crescente irritação com o trabalho da imprensa. A intolerância de Serra a críticas é bastante conhecida. Durante o primeiro turno, a candidata do PV, Marina Silva, chegou a registrar a relação conflituosa do tucano com o ofício dos jornalistas. “Existem duas formas de tentar intimidar a imprensa”, disse Marina. “Uma é aquela que vem a público e coloca de forma infeliz uma série de críticas. Outra é aquela que, de forma velada, tenta agredir jornalistas, pedir cabeça de jornalista, o que dá na mesma coisa, porque o respeito pela democracia e pela liberdade de imprensa é permitir que a informação circule”, afirmou a candidada. Segundo Marina, Serra “constrange e tenta intimidar jornalistas”. Os ataques sucessivos de Serra, porém, vêm sendo tratados com inexplicável compreensão por alguns setores. Quando o presidente Lula criticou a imprensa, suas opiniões foram encaradas como um atentado à liberdade de expressão e às ins­tituições democráticas. Já o presidenciável tucano, medido por uma régua diferente, faz a mesma coisa, mas não é acusado de nada disso. Veja exemplos recentes da animosidade de Serra.
VALOR ECONÔMICO
Na terça-feira 13, em Porto Alegre (RS), Serra criticou a imprensa e acusou o jornal “Valor Econômico” de atuar em favor de Dilma Rousseff. “Seu jornal faz manchete para o PT colocar no horário eleitoral”, disse Serra ao repórter Sérgio Bueno. Ele ficou irritadíssimo quando questionado sobre o ex-assessor Paulo Vieira de Souza e se deu ao direito de determinar qual o assunto deveria ser tratado pela reportagem do “Valor”. “Eu sei que, no caso, vocês não têm interesse na Casa Civil, naquilo que foi desviado. Seu jornal, pelo menos, não tem. Agora, no nosso caso, nós temos.” Neste momento, o ex-candidato do PMDB ao governo gaúcho, José Fogaça, que acompanhava Serra, cochichou-lhe no ouvido alguma coisa sobre supostas tendências políticas do repórter. “Quem, ele? Mas o “Valor” também é meio assim, não é só ele não”, disse Serra. Mais tarde, a diretora de redação do Valor, Vera Brandimarte, lamentou a atitude do tucano: “Todos os candidatos devem estar dispostos a responder questões, mesmo sobre temas que não lhes agradem”, ponderou.

FOLHA DE S.PAULO
Em 28 de setembro, em vez de responder à pergunta de um jornalista da “Folha de S.Paulo”, em Salvador (BA), Serra preferiu partir para o ataque. “Candidato, nesses últimos dias de campanha, qual deve ser a (sua) estratégia?”, perguntou o repórter Breno Costa. “Certamente não é perder tempo com matéria mentirosa como a que você fez”, respondeu Serra. O presidenciável referia-se à reportagem publicada pelo jornal três dias antes com dados negativos sobre sua gestão no governo de São Paulo. Em nota, a direção da campanha do tucano afirmou que os trechos levantados pela reportagem eram “irrelevantes” e acusou a “Folha” de “desinformar” o leitor e de “apostar na máxima petista de pregar que todos são iguais e cometem os mesmos equívocos na ação governamental”.

CNT – MÁRCIA PELTIER
No dia 15 de setembro, Serra irritou-se durante gravação e ameaçou deixar o programa “Jogo do Poder”, da CNT, apresentado por Márcia Peltier. Ele não gostou de perguntas feitas e depois de dizer que estavam “perdendo tempo” com aqueles assuntos, passou a discutir com Márcia. Disse que, em vez de tratarem do programa de governo, estavam repetindo “os argumentos do PT”. Em seguida, levantou-se para deixar o estúdio. “Não vou dar essa entrevista, você me desculpa. Faz de conta que não vim”, disse Serra, reclamando que a entrevista não era um “troço sério”. Logo depois, pediu que os equipamentos fossem desligados e disparou: “Isso aqui está um programa montado.” A apresentadora negou com firmeza a acusação e teve uma conversa reservada com Serra. Só então o candidato aceitou voltar ao estúdio.
CBN – MIRIAM LEITÃO
Em 10 de maio, durante entrevista matinal à rádio CBN, Serra manteve uma ríspida discussão com a jornalista Míriam Leitão. Ao participar da entrevista realizada em São Paulo, Míriam perguntou, por telefone, se o presidenciável respeitaria a autonomia do Banco Central
ou se presidiria também a instituição, caso vencesse a eleição. Serra primeiro respondeu que a suposição da jornalista era “brincadeira”. Na sequência, demonstrou que seu grau de irritação não parava de aumentar: “Você acha isso, sinceramente, que o Banco Central nunca erra? Tenha paciência!” Questionado se interviria na instituição ao se deparar com um erro, Serra interrompeu Míriam: “O que você
está dizendo, vai me perdoar, é uma grande bobagem.”

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Ibope aponta para término das eleições presidenciais em primeiro turno

Diferentemente, dos resultados da pesquisa do Datafolha, que concentrou seu levantamento em apenas um dia (27), o Ibope, cuja trabalho foi realizado nos dias 25,26 e 27, apresenta números favoráveis a candidata Dilma Rousseff, e sinaliza a possibilidade de vencer as eleições ainda em primeiro turno.

A pesquisa Ibope aparece no blog do jornalista da própria Folha de S. Paulo, Fernando Rodrigues, publicado nesta quarta-feira, 29 de setembro de 2010.

Ibope: Dilma 50% X 41% de todos os outros

petista ganharia no 1º turno se eleição fosse hoje

Pesquisa realizada pelo Ibope sob encomenda da CNI (Confederação Nacional da Indústria) nos dias 25 a 27 de setembro indica que Dilma Rousseff (PT) está com 50% contra 41% de todos os seus adversários somados. Se a eleição fosse hoje, a petista venceria no primeiro turno.

Para ganhar no primeiro turno é necessário ter, pelo menos, 50% mais 1 de todos os votos válidos (os dados apenas aos candidatos, descontados os brancos e os nulos).

Aqui todas as pesquisas eleitorais.

A pesquisa Ibope dá 27% para José Serra (PSDB). A candidata Marina Silva (PV) aparece com 13%. Os outros candidatos nanicos somados têm 1%. Há também 4% de brancos e nulos e 4% de indecisos.

Essa pesquisa Ibope foi realizada ao longo de 3 dias (25, 26 e 27). Não pode ser comparada com a pesquisa Datafolha, realizada apenas no dia 27 e que deu Dilma com 46%, Serra com 28% e Marina com 14%.

Ainda assim, o levantamento do Ibope (com 3.010 entrevistas e margem de erro máxima de 2 pontos percentuais) é um indicador de que o desfecho da eleição continua pendendo mais para o lado de Dilma Rousseff.  Por esse levantamento, a chance de a petista ganhar no primeiro turno está dada como fora da margem de erro.

A seguir, o gráfico com as várias pesquisas Ibope neste ano:

Outro dado interessante do Ibope é sobre a preferência partidárias dos eleitores brasileiros. O PT é disparado, com 27%, o preferido. Entende-se então o apelo à militância que Dilma Rousseff fez nos últimos dias. Trata-se de um apelo que o PSDB e José Serra teriam dificuldade para fazer, pois apenas 5% dos eleitores dizem preferir a sigla tucana. E só 3% afirmam preferir o PV, de Marina Silva. Eis os dados:


domingo, 26 de setembro de 2010

JORNAIS E POLÍTICA

Faltando apenas uma semana das eleições os jornais e revistas brasileiras finalmente se definem qual qual candidato a apóiam para a presidência da República - evidentemente nos governos dos estados em consequência. Por razões óbvias, diante das coberturas e dos discursos proferidos ao longo do período, os leitores destes meios certamente perceberam que José Serra foi tratado com diferença.

Nada a questionar, pois o jornalismo é um lugar também político, entretanto, o que não se deve esperar da mídia nacional e global é a imparcialidade, mas acima de tudo ética, a qual sinaliza ser honesto seguir a cartilha que diz respeito aos interesses sociais, e não somente atender aos anseios de grupos sociais, que conseguem interferir no curso do sistema político favoravelmente. Se o jornal Folha de São Paulo e Revista Veja não declaram o partido e o candidato, contudo, não há margem para incertezas. Por sua vez o Estado de São Paulo explicita seu apoio em editorial.

Texto publicado pelo Jornal O Estado de São Paulo, domingo (26), setembro de 2010.

Jornais e revistas condenam críticas de Lula à imprensa na campanha eleitoral

Estadão, Folha, Globo e Veja se posicionaram de forma crítica; só IstoÉ foi na linha contrária


Os principais jornais e revistas do país condenaram hoje as críticas que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez sobre o trabalho da imprensa nas eleições presidenciais do próximo domingo. "Lula e a candidata oficial têm-se limitado até aqui a vituperar a imprensa, exercendo seu próprio direito à livre expressão, embora em termos incompatíveis com a serenidade requerida no exercício do cargo que pretendem intercambiar", destacou a "Folha de S.Paulo" em um editorial intitulado "Todo poder tem limite".
O editorial remete a uma declaração de Lula, quem em um comício da candidata petista à Presidência, Dilma Roussef, afirmou que alguns meios de comunicação "são uma vergonha", pois, segundo ele, "se comportam como um partido político", mas não têm coragem para dizê-lo.
O presidente contestava informações que, nas últimas semanas, revelaram escândalos de corrupção no Ministério da Casa Civil, que até março passado era liderado pela candidata petista. Os escândalos custaram o cargo da sucessora de Dilma, Erenice Guerra, que acabou renunciando, pressionada pelas denúncias.
O editorial da "Folha" ressalta que "os altos índices de aprovação popular do presidente Lula não são fortuitos", assim como as pesquisas que apontam o claro favoritismo de Dilma para as eleições de 3 de outubro, graças ao carisma do governante. O jornal reconhece que isso resulta da gestão do atual Governo, que manteve "uma política econômica sensata" e "ampliou uma antes incipiente política de transferências de renda aos estratos sociais mais carentes", reduzindo a desigualdade social. No entanto, o editorial sustenta que "nem por isso seu governo pode julgar-se acima de críticas".
Na mesma linha se manifestou a "Carta ao Leitor" da edição desta semana da revista "Veja", um dos meios mais críticos a Lula. A publicação condena a "deformação" do ponto de vista do Governo, que atribui a "convicções de alguns que continuam ruminando a ideia totalitária do leninismo, segundo a qual Governo e povo se confundem e, portanto, a imprensa não tem o direito de criticar as autoridades". Segundo a "Carta ao Leitor", por denunciar os casos de corrupção na Casa Civil, a "Veja" e os grandes jornais do país foram tachados de "golpistas", porque a notícia poderia ter o "potencial para tirar votos da candidata oficial".
Opinião parecida foi manifestada pelo jornalista Merval Pereira, colunista do jornal "O Globo", quem na semana passada lançou o livro "O Lulismo no Poder", no qual analisa o que percebe como traços de autoritarismo do Governo do PT. Em sua coluna de hoje, Merval afirma que o recente caso de corrupção na Casa Civil "leva a crer que, ou presidente não sabe escolher seus assessores - o que coloca uma dúvida sobre a escolha de Dilma como sua candidata -, ou não consegue controlar sua equipe". "Lula é o sujeito mais enganado do mundo. Ou o que mais engana. Ou se acha capaz de enganar todo o mundo", critica Merval Pereira.
O jornal "O Estado de S.Paulo" também dedicou opinião sobre o assunto, em seu editorial "O mal a evitar", no qual declara apoio aberto ao candidato opositor José Serra, do PSDB. Para o periódico, Lula "tem o mal hábito de perder a compostura quando é contrariado" e "também todo o direito de não estar gostando da cobertura" que "quase todos os órgãos de imprensa" tem dado à "escandalosa deterioração moral do Governo que preside". "Com todo o peso da responsabilidade à qual nunca se subtraiu em 135 anos de lutas, o 'Estado' apoia a candidatura de José Serra", por seus "méritos", "seu currículo exemplar" e "pelo que ele pode representar para a recondução do país ao desenvolvimento econômico e social pautado por valores éticos", indicou.
Na grande imprensa brasileira, o único veículo que apresentou hoje uma posição diferente foi a revista "IstoÉ", também em editorial. Em aparente alusão à imprensa, a revista diz que "diversos agentes envolvidos no processo eleitoral não deram ouvido e espaço à voz das ruas e a atacam de maneira visceral e virulenta pela opção seguida. Como se ela estivesse errando pelasimples razão de escolher".

sábado, 25 de setembro de 2010

Chávez e a democracia dos pobres

A América Latina continua um lugar desconhecido por uma sociedade que viveu colonizada por séculos. Entretanto, há mudanças no cenário político, com certa vantagem para ações voltadas para o atendimento da população mais pobre. Em essência, a região passa por ruptura nas pirâmides sociais.


Neste sentido, Hugo Chávez se mantém no poder, assim como Evo Morales e outros presidentes da região. Abaixo texto que trata do tema, com análises que foge ao senso comum e idéias de mercado definidas pelos meios de comunicação brasileiros. Publicado pelo Jornal Folha de S. Paulo, sábado, 25 de setembro de 2010.

CLÓVIS ROSSI

Chávez ganha com afeto de pobres

Uso da máquina pública, do Exército e uma oposição acuada não são a completa explicação para sua vitória


CARACAS - ATÉ a oposição admite que o presidente Hugo Chávez fará a maioria na Assembleia Nacional a ser eleita amanhã. Na melhor das hipóteses, espera chegar a 67 das 165 vagas em jogo, o que impediria o presidente de governar por decreto, o mecanismo pelo qual toca à frente seu projeto de "socialismo do século 21".
A nova vitória de Chávez será, se confirmada, a 13ª em 15 consultas populares, incluídos referendos, nos 11 anos de reinado.
Chávez ganha porque usa impudicamente a máquina pública? Sim. O Conselho Nacional Eleitoral acaba de divulgar, por exemplo, que a TV pública (VTV, Venezolana de Televisión) dedicou 90% de seus espaços informativos para o governista PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela).
Até o Exército entrou na campanha do PSUV, usando sua rede capilar em todo o país.
Chávez ganha porque acuou a oposição, retirando poderes e funções de eleitos oposicionistas, e atacando a mídia? Sim, também.
Mas Chávez ganha, acima de tudo, porque seu "vínculo afetivo com um setor do país continua sendo muito poderoso", como admite Teodoro Petkoff, talvez o mais lúcido dos oposicionistas, um ex-guerrilheiro que transitou para a ortodoxia econômica e hoje é editor do jornal de oposição "Tal Cual".
Um só dado basta para explicar a solidez do "vínculo afetivo": a pobreza, nos anos Chávez, caiu de 49% para 26,4% da população, segundo o presidente do Instituto Nacional de Estatísticas, Elías Eljuri.
É verdade que a oposição contesta o número, mas não o fato de que a pobreza se reduziu.
Mais: os pobres têm a sensação de que deixaram de ser "invisíveis", ao contrário do que ocorria nos anos 90, período de decadência da democracia e da economia venezuelanas.
A questão chave da eleição de amanhã, portanto, é menos o número de assentos que a oposição conquistará (hoje, tem dez cadeiras, de ex-chavistas, porque cometeu a estupidez de não ter se apresentado no pleito de 2005).
Decisivo, mesmo, é saber se o modelo populista travestido de "socialismo do século 21" tem fôlego para continuar a conquistar o afeto da maioria.
As previsões não são nada favoráveis: afeto, como é óbvio no mundo inteiro, se conquista pelo bolso e o bolso dos venezuelanos estará entre 3% e 4% mais vazio este ano, de acordo com as previsões do economista Pedro Palma, ligado à Fedecámaras, a central empresarial.
Consequência de uma segunda queda consecutiva da economia, com o que a Venezuela "socialista" destoa totalmente do resto da América Latina "capitalista", que vai crescer 4%, na média.
O que não vai diminuir é a violência -que atinge mais os pobres, como no Brasil. No ano passado, um venezuelano foi assassinado a cada meia hora. A taxa de homicídios é de 75 por 100 mil habitantes, o dobro da Colômbia em guerra há meio século, três vezes mais que o assustado Brasil.
A eleição de amanhã acabará medindo o tamanho do afeto e da erosão que as dificuldades causam nele. Mas não reduzirão o ímpeto revolucionário de Chávez, que, no encerramento da campanha, já avisou ao país que está "esquentando os motores" para 2012, ano da eleição presidencial.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Lula questiona posicionamento da mídia

Ninguém imagina a mídia longe do debate político, entretanto, nesta eleições algumas grandes empresas de comunicação decidiram participar efetivamente do processo eleitoral, agendando assuntos que atacam o governo federal e valoriza a imagem da oposição. Não razão para questionar as denúncias feitas pelos jornais - embora faça parte de estratégia política -, que são necessárias na busca de representar os interesses sociais, ao torná-las públicas. 

Mas de qualquer forma há excessos de um lado, que é contra atacado pelos Petistas, liderados pelo presidente da república. A democracia diz respeito ao espaço social e não simplesmente de liberdade para domínio autoritário institucional.


A concentração do poder de empresas de comunicação no Brasil é fato, com ampliação do poder de difusão de notícias e pode simbólico. Abaixo crítica de Lula. Matéria publicado pelo jornal Estado de Minas, quinta-feira, 23 de setembro de 2010.



Para Lula, imprensa deveria assumir que tem candidato Presidente afirma que, no Brasil, nove ou 10 famílias dominam a mídia brasileira


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a fazer duras críticas à imprensa, rebateu acusações de autoritarismo e reafirmou seu papel de líder partidário simultâneo ao de chefe de Estado, em longa entrevista concedida ao portal Terra, cuja primeira parte foi publicada na manhã desta quinta-feira. Lula sugeriu que a imprensa "deveria assumir categoricamente" que tem candidato e partido, deixando de "vender uma neutralidade disfarçada". O presidente assumiu um tom cauteloso ao responder se Dilma Rousseff (PT) será eleita já no primeiro turno da eleição.

"A imprensa brasileira deveria assumir categoricamente que ela tem um candidato e tem um partido, que falasse. Seria mais simples, seria mais fácil. O que não dá é para as pessoas ficarem vendendo uma neutralidade disfarçada", afirmou o presidente da República. Questionado sobre os ataques feitos anteriormente à imprensa, Lula disse duvidar "que exista um país na face da terra com mais liberdade de comunicação do que neste país, da parte do governo".

"Agora, a verdade é que nós temos nove ou dez famílias que dominam toda a comunicação desse país. A verdade é essa. A verdade é que você viaja pelo Brasil e você tem duas ou três famílias que são donas dos canais de televisão. E os mesmos são donos das rádios e os mesmos são donos dos jornais...", afirmou o presidente. Para ele, "muita gente" não teria gostado do fato de seu governo ter distribuído os recursos para publicidade para imprensa entre vários Estados brasileiros. "Hoje, o jornalzinho do interior recebe uma parcela da publicidade do governo."

Para Lula, "o que acontece muitas vezes é que uma crítica que você recebe é tida como democrática e uma crítica que você faz é tida como antidemocrática". "Ou seja, como se determinados setores da imprensa estivessem acima de Deus e ninguém pudesse ser criticado", disse o presidente. No entendimento de Lula, "a posição de um presidente é tomada como ser humano, jornalista escreve como ser humano, juiz julga como ser humano. Ou seja, temos um padrão de comportamento e julgamento e, portanto, todos nós estamos à mercê da crítica".

Num trecho da entrevista, o presidente disse que, independentemente de quem seja o futuro presidente da República, um novo marco regulatório de telecomunicações precisa ser discutido. "E as pessoas, ao invés de ficarem contra, deveriam participar, ajudar a construir, porque será inexorável", afirmou. "Discutir isso é uma necessidade da nação brasileira. Uma necessidade dos empresários, dos especialistas, dos jornalistas, ou seja de todo o mundo para ver se a gente se coloca de acordo com o que nós queremos de telecomunicações para o futuro do país."

Eleições
Sobre as críticas ao seu comportamento como líder partidário, Lula disse que "não é possível o presidente da República agir como magistrado. "Agora, quando chega época de eleição não é possível o presidente da República ficar como magistrado porque eu tenho um lado. Eu tenho um partido e tenho candidato", afirmou. Ao ser questionado se não tem interferido no processo eleitoral ao adotar esse comportamento, o presidente Lula rebateu: "Deveria ser cobrado quem perdeu. Quem não conseguiu fazer o sucessor, porque o sucessor é uma das prioridades de qualquer governo para dar continuidade a um programa que você acredita que vai acontecer".

Lula disse ter medo que o Brasil "sofra um retrocesso" caso sua candidata não seja eleita. "Por isso que eu tenho candidato. Seria inexplicável para a sociedade se eu entrasse numa redoma de vidro e falasse: olha, aconteça o que acontecer nas eleições, o presidente da República não pode dar palpite. Mas nem para escolher o Papa acontece isso", afirmou o presidente.

Lula mostrou cautela sobre a possibilidade de Dilma Rousseff já vencer no primeiro turno da eleição, no próximo dia 3. "O que eu acho extremamente importante é que nesse processo eleitoral, a gente precisa primeiro ter muita cautela. Esse é o momento de um time que está ganhando de dois a zero. O adversário está dando botinada, está chutando no peito, está chutando na canela, o juiz não está apitando falta e nós não podemos perder a cabeça, porque o que eles querem é expulsar alguém do nosso time, para a gente ficar em minoria", disse o presidente.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Dinheiro e futebol

O jogador formado para ser mito vence a seriedade do técnico. Em essência esta é a realidade vivida pelo santos, que tem um elenco formado por jovens jogadores, com resultados surpreendentes dentro de campo, mas nem tanto fora dele, a rigor, os interesses dos cartolas falam mais alto do que o futebol. Na queda de braço entre Neymar, que deveria valer milhões, e Dorival Júnior, o fim surpreendente seria a consagração da ética e comportamento de equipe, mas o resultado foi o esperado. Venceu o dinheiro, mais uma vez.

A pergunta agora é: qual o futuro do time e de Neymar? Conseguirá uma boa relação com os amigos em campo e com o próximo treinador? Deve dar o trivial: a perda de um mito, ainda bem.

Texto publicado pelo Jornal Estado de São Paulo, quarta-feira, 22 de setembro de 2010.

Santos fica do lado de Neymar e demite Dorival Júnior

Diretoria afirma que não foi consultada sobre manutenção da punição ao jogador e dispensa treinador por insubordinação



Ernesto Rodrigues/AEDorival Júnior não é mais o técnico do Santos. A cúpula ficou encurralada com a decisão do treinador de manter Neymar afastado por tempo indeterminado, tirando a principal arma do time do clássico contra o arquirrival Corinthians, às 22 horas desta quarta-feira, na Vila Belmiro, e resolveu demiti-lo, após reunião de quase três horas. O receio era o desgaste político que atual administração sofreria no caso de uma derrota se Neymar não estivesse em campo.
Ernesto Rodrigues/AE
Dorival disputou 61 jogos pelo Santos


O ex-volante Narciso, técnico do sub20, deve dirigir o time interinamente até a contratação de um novo técnico. A informação foi confirmada por fontes ligadas à diretoria, que não se pronunciou até o fim da noite desta terça-feira. Com a queda do técnico, Neymar está confirmado no clássico.
Nas primeiras horas da noite desta terça-feira os principais dirigentes do futebol e assessores com muito poder se reuniram com o vice-presidente da diretoria Odílio Rodrigues no Hotel Recanto dos Alvinegros, anexo ao Centro de Treinamento Rei Pelé e onde os jogadores estão concentrados à espera do clássico com o Corinthians, na Vila. O presidente Luis Alvaro de Oliveira Ribeiro não estava presente porque está internado em um hospital da capital para fazer uma pequena cirurgia para remoção das bolsas das pálpebras, mas participava por telefone. Dorival Júnior também não participou.
Depois que Neymar xingou Dorival Júnior, Edu Dracena e Marquinhos durante o jogo contra o Atlético-GO, quarta-feira passada, na Vila Belmiro, o clube passou a viver um verdadeiro inferno. Na reunião da sexta-feira passada, o treinador exigia a punição do garoto mimado por tempo indeterminado. A diretoria empurrou com a barriga para ganhar tempo. No sábado cedo, um batalhão de dirigentes procurou mostrar ao treinador que o patrimônio mais valioso do Santos estava sendo exposto de maneira negativa e que em caso de uma punição mais drástica, o candidato a mito ficaria com a imagem desgastada. Dorival se manteve irredutível, diante da indignação do seu braço direito, o auxiliar técnico Ivan Izzo. Ele não perdoa a ousadia de Neymar ao atirar isotônico na sua direção durante discussão nos vestiários, após o jogo de quarta.
De um jeito ou de outro, ficou decidido na reunião de sábado que Dorival Júnior mais uma vez não falaria com a imprensa para não dar detalhes sobre a punição de Neymar. Para efeito externo, seria por tempo indeterminado e com nova rodada de negociações entre o técnico e os dirigentes na segunda-feira. Mas internamente foi combinado que Neymar não treinaria no domingo, apareceria de surpresa em Campinas e, num gesto de arrependimento, voltaria a pedir desculpas a todos e até participaria da oração do time pouco antes do jogo. Tudo saiu perfeito. Por pouco Neymar não jogou contra o Guarani, sob a alegação de que Marcel teve indisposição (estava gripado) durante o aquecimento. Tudo corria normalmente até que nesta terça à tarde, quando Dorival Júnior repensou o seu futuro como treinador e fez valer o seu perfil de homem correto e rompeu o acordo, tirando Neymar do clássico contra o Corinthians.
A decisão foi difícil demais para o treinador, que demonstrou nervosismo durante a coletiva de imprensa. Nela ele repetiu que vem sendo um gerenciador de problemas no Santos, referindo-se aos seguidos atos de indisciplina que teve que enfrentar durante o período em que Robinho esteve no Santos e depois de sua segunda passagem pelo clube. "Vamos dar um tempo para que Neymar se recupere em todos os sentidos. Estou fazendo o melhor para o atleta. É bom para ele e para o clube não sei", disse o treinador na coletiva de imprensa. Ele revelou ter conversado com treinadores com maior rodagem antes de tomar a decisão durante o desinteressante rachão desta terça à tarde, no CT Rei Pelé. Em alguns momentos, ele parecia aliviado por não ter compactuar com a indisciplina e a insolência de um garoto de 18 anos e por não ficar marcado como um treinador frouxo, comprometendo sua carreira que em apenas sete meses foi enriquecida com os títulos do Campeonato Paulista e da Copa do Brasil, além de ter montado o time mais badalado do país nos últimos anos.

Governo e imprensa

A presidente da Argentina, Cristina Kirchner, não recua na busca de levar os principais jornais do país à justiça, num cenário de ruptura com a imprensa local. Apesar das publicações de críticas de antidemocrático, o governo se posiciona com firmeza, o que poderá criar mudanças na estrutura dos meios de comunicação argertinos.

Texto publicado pelo Jornal Folha de S. Paulo quarta-feira, em 22 de setembro de 2010.


Cristina aponta "crimes" de donos de jornais
Argentina apresenta denúncia em que acusa os proprietários de "La Nación" e "Clarín" de homicídio e tortura

Casa Rosada diz que delitos foram cometidos nos anos 70, durante processo de compra de empresa de papel-jornal

GUSTAVO HENNEMANN
DE BUENOS AIRES
O governo argentino da presidente Cristina Kirchner apresentou ontem uma denúncia formal à Justiça contra os dirigentes dos jornais "Clarín" e "La Nación", maiores veículos impressos do país, por crimes contra a humanidade ocorridos supostamente em 1976.
Conforme a denúncia, os delitos de "homicídio, extorsão, privação ilegítima de liberdade, tortura e associação ilícita" foram cometidos pelos dirigentes em cumplicidade com o último regime militar argentino (1976-1983) durante a negociação da empresa Papel Prensa.
Atualmente a fábrica produz 75% do papel-jornal consumido no país.
As ações da empresa que hoje pertencem aos jornais denunciados foram compradas na época da família Graiver, vítima da repressão estatal durante a ditadura.
Na versão do governo, os integrantes da família sofreram "intimidações e ameaças" que os obrigaram a assinar os contratos de venda.
Apesar de terem sido presos pelos militares somente após a negociação, a transferência das ações ocorreu quando os Graiver já estavam fragilizados e não podiam decidir, alega o governo.
O momento da prisão e as intimidações fizeram parte de um esquema "articulado pelos dirigentes dos jornais junto à cúpula do governo de fato", diz a denúncia, apresentada em nome do governo pela Secretaria de Direitos Humanos e pela Procuradoria do Tesouro -equivalente à Advocacia-Geral da União.
O documento entregue pelo governo à Justiça também apresenta relatos e testemunhos que consideram os jornais "Clarín" e "La Nación" meios de comunicação "associados com a ditadura" que foram "beneficiados" pelo "aparato clandestino de terrorismo do Estado" em outros negócios posteriores.
Ao denunciar os jornais, o governo se associou como denunciante a integrantes da família Graiver em um processo que já tramita em um tribunal de La Plata (Província de Buenos Aires). Nele investiga-se a negociação da Papel Prensa.
Junto com as informações que tentam incriminar os dirigentes dos jornais e ex-governantes do regime militar, o governo pediu à Justiça que interrogue os principais acionistas do jornal "Clarín", Ernestina Herrera de Noble e Héctor Magnetto, e o diretor de redação do "La Nación", Bartolomé Luis Mitre.
O pedido de interrogatório também se estende aos ex-dirigentes militares, em maioria já presos.

PLANO CONCRETIZADO
A denúncia concretiza o plano da presidente Cristina Kirchner, que mantém uma guerra declarada contra os dois jornais. Ambos os veículos adotaram uma linha editorial contrária ao governo em 2008.
Cristina já havia anunciado a intenção de processar os dirigentes dos dois diários no mês passado em um evento público.
Em um comunicado, os dois jornais afirmaram ontem que não houve delito algum na aquisição da Papel Prensa e que, em 27 anos de democracia, nunca surgiu outra denúncia semelhante.
A atitude do governo é "uma aberração moral e jurídica" que tenta intimidar veículos que não são alinhados politicamente, diz a nota.
"O governo insiste em mentir, reescrever a história e manipular os direitos humanos como ferramenta de perseguição e represália", afirma ainda o texto.

domingo, 12 de setembro de 2010

FOLHA NA CAMPANHA

Importante a análise de Suzana Singer, Ombudsman do Jornal Folha de S. Paulo, sobre a busca de bom senso na cobertura do diário nas eleições presidenciais. A crítica contra o jornalão é intensa em todos país, principalmente nas redes sociais, em especial no twitter (45 mil mensagem de desaprovação do seu noticiário político). Texto publicado, domingo, 12 de setembro.


OMBUDSMAN

SUZANA SINGER - ombudsman@uol.com.br @folha_ombudsman
O ATAQUE DOS PÁSSAROS

A manchete de domingo desencadeou uma onda anti-Folha no Twitter, que o jornal ignorou


A FOLHA VEM se dedicando a revirar vida e obra de Dilma Rousseff. Foi à Bulgária conversar com parentes que nem a candidata conhece, levantou a fase brizolista da ex-ministra, suas convicções teóricas e até uma loja do tipo R$ 1,99 que ela teve com uma parente no Sul. Tudo isso faz sentido, já que Dilma pode se tornar presidente do Brasil já no primeiro escrutínio que disputa.
Mas, no domingo passado, o jornal avançou o sinal ao colocar na manchete "Consumidor de luz pagou R$ 1 bi por falha de Dilma". O problema nem era a reportagem, que questionava a falta de iniciativa do Ministério de Minas e Energia para mudar uma lei que acabava por beneficiar com isenção na conta de luz quem não precisava.
Colocar uma lupa nas gestões da candidata do governo é uma excelente iniciativa, mas dar tamanho destaque a um assunto como este não se justifica jornalisticamente.
Foi iniciativa de Dilma criar a tal Tarifa Social? Não, foi instituída no governo Fernando Henrique Cardoso. É fácil mexer com um benefício social? Não, o argumento de que faltava um cadastro de pobres que permitisse identificar apenas os que mereciam a benesse faz muito sentido. Existe alguma suspeita de desvio de verbas? Nada indica.
O lide da reportagem dava um peso indevido ao que se tinha apurado. Dizia que a propaganda eleitoral apresenta a candidata do PT como uma "eficiente gestora", mas que "um erro coloca em xeque essa imagem". Essa tem que ser uma conclusão do leitor, não do jornalista.
Uma manchete forçada como a da conta de luz, somada a todo o noticiário sobre o escândalo da Receita, desequilibrou a cobertura eleitoral. Dilma está bem à frente nas pesquisas de intenção de voto e isso é suficiente para que se dê mais atenção a ela do que a seu concorrente, mas, há dias, José Serra só aparece na Folha para fazer "denúncias". Nada sobre seu governo recente em São Paulo. Nada sobre promessas inatingíveis, por exemplo.
Os leitores perceberam a assimetria. Durante a semana, foram 194 mensagens à ombudsman protestando contra o noticiário, mas o maior ataque ocorreu no Twitter, a rede social simbolizada por um pássaro azul, que reúne pessoas dispostas a dizerem o que pensam em 140 caracteres. Até quinta-feira passada, tinham sido postadas mais de 45 mil mensagens anti-Folha.

CRIATIVIDADE
Os internautas inventaram manchetes absurdas sobre a candidata de Lula: "Empresa de Dilma forneceu a antena para o iPhone 4", "Dilma disse para Paulo Coelho, há 20 anos: continue a escrever, rapaz, você tem talento!", "Serra lamenta: a Dilma me indicou o Xampu Esperança" e "Errar é humano. Colocar a culpa na Dilma está no Manual de Redação da Folha".
O movimento batizado de #Dilmafactsbyfolha virou um dos assuntos mais populares ("trending topics") do Twitter em todo o mundo, impulsionado, em parte, pela militância política -segundo levantamento da Bites, empresa de consultoria de planejamento estratégico em redes sociais, 11 mil tuítes usaram um #ondavermelha, respondendo a um chamamento da campanha do PT na rede. Até o candidato a governador Aloizio Mercadante elogiou quem engrossou o coro contra o jornal.
Mas é um erro pensar que apenas zumbis petistas incitados por lideranças botaram fogo no Twitter. O partido não chegou a esse nível de competência computacional.
Na manada anti-Folha, havia muito leitor indignado, gente que não queria perder a piada, além de velhos ressentidos com o jornal.
Não dá para desprezar essa reação e a Folha fez isso. Não respondeu aos internautas no Twitter e não noticiou o fenômeno. O "Cala Boca Galvão" durante a Copa virou notícia. No primeiro debate eleitoral on-line, feito por Folha/UOL em agosto, publicou-se com orgulho que o evento tinha sido um "trending topic". Não dá para olhar para as redes sociais apenas quando interessa.
A Folha deveria retomar o equilíbrio na sua cobertura eleitoral e abrir espaço para vozes dissonantes. O apartidarismo -e não ter medo de crítica- sempre foram características preciosas deste jornal.

domingo, 5 de setembro de 2010

MÍDIA, RECEITA E DENÚNCIAS

Período de eleições é o momento dos escândalos aparecerem, cujo objetivo é criar espaço de debate público que culmine com prejuízos para uma parte. Em meio as verdades os interesses formam uma aura de dúvidas, afinal seria mesmo ingenuidade acreditar que o poder é um lugar em que a assepsia está em todos os cantos. Certamente, as denúncias atingiram e atingirão governos ao longo da história. Não se trata de naturalizar a falta de moral e ética contra o público, mas analisar o tempo dos fatos conforme suas relações. 

A participação da mídia na busca pela transparência é fundamental, entretanto, no período eleitoral as empresas de comunicação se investem tanto na defesa partidária (salvo exceção) que a informação se mistura com desinformação, com prejuízos absolutos para a formação livre de pensamento. Desta forma, no jornal paulista, Folha de S. Paulo de hoje (domingo-5) dois olhares.

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JANIO DE FREITAS

Eleições criminais

Não há motivo para supor que das investigações resultarão consequências exigidas pelas leis

OS FATOS e os não-fatos já mencionados, em torno de dados sigilosos de pessoas ligadas a José Serra, não exigem imparcialidade virtuosa para a percepção de que, até agora, tanto poderiam proceder de um lado como de outro na disputa pela Presidência.
Assim como a petistas seria possível ocorrer a violação e o uso de sigilos para comprometer Serra, aliados de Serra poderiam pensar na montagem de um ardil para incriminar a candidatura de Dilma Rousseff. E, por ora, não se tem indício, com alguma confiabilidade, contra um lado ou outro. O que há, nesse sentido, são preferências infiltradas no noticiário e dando-lhe o tom, ainda que parte delas seja mais por precipitação do que por motivos eleitorais.
A última contribuição desse estranho personagem Antonio Carlos Atella Ferreira, que tanto perde na memória atos inesquecíveis como os recobra com rápida e fácil dubiedade, é ilustrativa do momento indefinido. "Vou fazer a vida com essa historinha", lema que expôs logo ao ser identificado como parte do embrulho, é uma proclamação de caráter e intenções, para não dizer de objetivo de vida. A curiosidade se oferece: ainda não fez a vida?
A filiação de Atella ao PT traz para o caso mais uma peça amorfa, sujeita a questionamento: a Justiça Eleitoral. Como é possível que só seis anos depois da filiação o Tribunal Regional Eleitoral-SP a tenha "excluído" por incorreção no registro?
No intervalo 2003-2009, houve eleições para prefeito, governo do Estado, presidente da República e ainda para vereadores, deputados estaduais, deputados federais e senadores. Em São Paulo, a maior concentração da Justiça Eleitoral no país não sabia quais filiações partidárias eram corretas ou não? Logo, não seria estranho haver irregulares entre os candidatos e até entre os eleitos.
E quanto a Atella Ferreira, como e por que veio a saber da incorreção, afinal? Descoberta havida em momento tão propício para engrossar o caso, dois meses depois da quebra do sigilo de Verônica Serra em que é coautor, com o próprio nome a indicá-lo na fraude. A Justiça Eleitoral deve explicações.
Desde 1982, quando o SNI, o candidato Moreira Franco, integrantes do departamento de jornalismo da Globo e a empresa de informática Proconsult se uniram para fraudar a eleição no Estado do Rio, as eleições brasileiras são terreno de bandidismo eleitoral, do mais ordinário ao mais grave. Todos os episódios provocaram inquéritos de polícias estaduais e da Federal, do Ministério Público, da Justiça Eleitoral e da Justiça Criminal. Nenhum, jamais, levou a alguma das consequências determinadas pelas leis.
Estamos diante de mais um caso. Cercado de suspeições e hipóteses viáveis, em diferentes sentidos. Com toda a certeza, recheado de crimes graves, inclusive contra preceito da Constituição. Mas não há motivo para supor que das várias investigações resultarão as consequências exigidas pelas leis. Eleições, aqui, misturam-se muito com outros propósitos e atividades.

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SUZANA SINGER - ombudsman@uol.com.br

@folha_ombudsman


À PROCURA DO VILÃO

PT E PSDB IMPUTAM UM AO OUTRO A CULPA PELA QUEBRA DE SIGILO FISCAL; CABE À IMPRENSA ESCLARECER ESSA HISTÓRIA

AS MANCHETES de jornal finalmente chegaram ao horário eleitoral gratuito. Para dar credibilidade ao escândalo da quebra do sigilo fiscal de Verônica Serra, os tucanos exibiram, na quinta-feira à noite, páginas da Folha e do "Estado de S. Paulo" falando do caso.
PSDB e PT jogam com a confusão: enquanto não se esclarece o episódio, tentam imputar culpa um ao outro. A Receita Federal, pelo que foi noticiado, não tem se pautado pela transparência nas investigações. A Polícia Federal ainda não mostrou resultados. Cabe, portanto, à imprensa colocar os inúmeros pingos nos "is" dessa história.
O principal deles é esclarecer a mando de quem foram remexidos os documentos da filha de José Serra.
As suspeitas recaem sobre o PT. Primeiro, pelo histórico: a espiada na conta bancária do caseiro Francenildo (2006), os "aloprados" com dinheiro vivo (2006), o levantamento de gastos pessoais de Ruth Cardoso (2008) e a recente descoberta, de junho, de que havia um dossiê com dados sigilosos de pessoas do PSDB nas mãos de um grupo da pré-campanha de Dilma Rousseff.
Outro agravante contra o partido do governo é a revelação de que o contador que entregou a procuração falsa de Verônica Serra era filiado ao PT, como revelou o "Jornal Nacional" de sexta-feira.
Há ainda o argumento da motivação: já que vários tucanos tiveram o sigilo violado, o responsável deve ser o inimigo nº 1.
São todos indícios, ainda não conclusivos. Petistas já espalharam que interessaria também a Aécio Neves reunir dados sobre o colega de partido que disputava com ele a vez de se candidatar à Presidência, em setembro do ano passado, quando a cópia da declaração do Imposto de Renda de Verônica foi obtida.

JORNALISMO DECLARATÓRIO
O primeiro passo para a imprensa agora é distanciar-se da troca de acusações. Basta registrar que Serra disse que "nos tornaremos todos francenildos" e que Dilma retrucou que "a oposição está desesperada". Da verborragia política, não sairá nada além disso.
Serra joga pistas, como dizer que dados da filha já estavam em "blogs sujos", mas não explica o que havia neles nem se foram obtidos por meio de ato ilícito. Dilma só se preocupa em minimizar o ocorrido -um "malfeito" na Receita, segundo ela- e em ficar o mais longe possível da lama que emerge a cada dia.
Chega de jornalismo declaratório. Mesmo aquele em "off", como fez a Folha na sexta-feira, ao manchetar "Serra diz ter feito alerta a Lula sobre ataques a sua filha". A afirmação do candidato teria sido feita a "aliados".
Reproduzindo as aspas acriticamente -sem indagar por que Serra não tornou esse fato público antes-, o jornal prestou um serviço ao tucano: permitiu que criticasse Lula, sem o ônus de atacar, na televisão, um presidente tão popular.
Não será tarefa fácil descobrir quem deu a ordem para levantar os dados de Verônica Serra, porque o principal personagem -o contador- tem se revelado um escroque, exigindo dinheiro para dar entrevistas e fazendo troça de seus minutos de celebridade.
A Folha não paga por informação, entrevista nem para que alguém pose para foto -e faz muito bem. Na hora em que o talão de cheques entra em cena, a confiabilidade da apuração cai por terra. É verdade que nenhuma informação passada a jornalistas é desinteressada, mas a motivada por dinheiro é a mais frágil de todas.
Sem por a mão no bolso e sem esperar revelações dos candidatos, a Folha está diante do desafio de achar o vilão desse enredo antes de 3 de outubro. Depois da eleição, o escândalo da filha do presidenciável se juntará ao dos aloprados e tantos outros, que estão hoje esquecidos ou foram atropelados por novas baixarias políticas.

Mexicanização

Seria ingenuidade imaginar que haja espaço para uma administração fora dos mercados, o qual foi seguido por Lula, longe de ser um defensor do socialismo. Entretanto, não se pode esconder a realidade com o objetivo de preservar domínios, sobre uma sociedade que se quer submissa e sem memória.


Editoriais
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O alerta de Lula
Há 14 anos, em artigo na Folha, o atual mandatário acenava com os riscos de "mexicanização" e uso abusivo da máquina pública

"Num país onde se pratica o fisiologismo explícito e o uso e abuso da máquina pública em proveito próprio, a reeleição pode conduzir a um processo de mexicanização". O alerta foi emitido em 1996 por Luiz Inácio Lula da Silva em artigo publicado pela Folha.
O líder petista, que havia dois anos perdera a eleição no primeiro turno para Fernando Henrique Cardoso, mostrava-se preocupado. Via o risco de, aprovada a possibilidade de renovação do mandato, o PSDB transformar-se numa espécie de Partido Revolucionário Institucional -o PRI, que governou o México de 1926 a 2000.
Lula chamava a atenção para o peso desproporcional que os detentores do poder podem exercer num processo eleitoral por meio do aparelhamento o Estado e nebulosa arrecadação de fundos:
"O Estado mobiliza um conjunto de obras e recursos que podem ser postos a serviço de caixinhas eleitorais e troca de favores. Não é segredo para ninguém que as grandes obras públicas podem ser sobrefaturadas, e um significativo percentual delas acaba nas contas numeradas dos assessores dos mandatários, não para uso pessoal, dirão eles, é claro, mas para financiar a futura campanha. São rios de dinheiro [...] para fazer propaganda de campanha e programas mirabolantes, com a mais sofisticada técnica de comunicações para ludibriar o eleitorado".
Diante das pretensões da situação, favorável à continuidade de FHC para que o Brasil prosseguisse dando certo, Lula alfinetava: "E por que, então, não ressuscitar de uma vez o partido monarquista e colocar FHC no trono do Brasil para sempre?".
Como se sabe, aprovada e emenda da reeleição, o tucano conquistou mais um mandato e foi sucedido pelo próprio petista. Os artifícios retóricos e os argumentos que constavam do artigo de Lula poderiam, quase que integralmente, ser agora esgrimidos contra seu próprio governo.
De fato, poucas vezes na história republicana o fisiologismo foi tão explícito e subordinou-se tanto a máquina pública ao proveito partidário. Por certo, tornaram-se ainda mais caudalosos os rios de dinheiro vertidos na candidatura continuísta -e mais sofisticadas as técnicas de comunicação para "ludibriar o eleitorado".
Utilizou-as Lula, com sua vocação de animador de plateias, para inventar a herdeira que, sem nenhuma experiência eleitoral, poderá ocupar seu trono -ou melhor, a cadeira presidencial.
As recorrentes comparações com a história mexicana, que ora voltam à cena, podem ser úteis nos torneios verbais, mas não vão muito além disso. Por mais longos que possam ser os ciclos de grupos políticos no poder, as democracias evoluídas (o que não era o caso do México) acabam sempre por experimentar uma saudável alternância administrativa.
São os fundamentos desse sistema de governo que, acima de tudo, precisam ser fortalecidos no Brasil. Não há dúvida de que a experiência democrática em nosso país já atingiu padrões elogiáveis de funcionamento. É preciso porém cultivá-la para que não se perca em consensos perigosos -mais ainda neste momento em que o continuísmo político poderá consumar-se em inédita hegemonia.