quinta-feira, 26 de agosto de 2010

FOLHA E LULA

A mídia tem grande importância no fluxo de informação que permite o homem moderno ter contato com os fatos, portanto, é imprescindível para a formação da opinião pública e espírito crítico. Entretanto, há em determinados momentos inversão de valores, e ao invés de ser um meio noticioso torna-se ponta de lança de partidos políticos, com o intuito de defender interesses de grupos sociais em detrimento do interesse da leitor, que nesta ordem se transforma em simples consumidor de notícias.

Com razão ou não, sendo fiel ao ocorrido ou não, o presidente Lula ao longo dos anos reclama da forma que foi tratado pelo diretor de redação do jornal paulista em almoço com redatores em 2002, conforme texto abaixo, publicado pelo próprio jornal. Infelizmente, o comportamento do diário nestes eleições, declaradamente partidário leva a imaginar a existência da atitude de preconceito. 

Texto publicado pelo Jornal Folha de S. Paulo, 26 de agosto de 2010.

Lula critica Folha e diz que sofreu preconceito
Em comício, presidente cita almoço que abandonou após ser questionado sobre alianças

DO ENVIADO A CAMPO GRANDE
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou anteontem a imprensa em comício em Campo Grande (MS) ao lado da candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff.
Lula disse que foi vítima de preconceito da mídia que, segundo o presidente, não acreditava que ele seria capaz de governar por não ter curso universitário e por não saber falar inglês.
"Uma vez eu estava almoçando na Folha de S.Paulo e o diretor da Folha de S.Paulo perguntou para mim: "Escuta aqui, candidato, o senhor fala inglês?" Eu disse não. "Como é que você quer governar o Brasil se não fala inglês?" Eu falei: "Mas eu vou arrumar um tradutor". "Mas assim não é possível. O Brasil precisa ter um presidente que fala inglês". E eu perguntei para ele: "Alguém já perguntou se o Bill Clinton fala português?", afirmou.
"Eles achavam que Bill Clinton não tinha obrigação de falar português. Era eu, o subalterno, o país colonizado, que tinha que falar inglês. Teve uma hora que eu me senti chateado e levantei da mesa. E falei: "Não vim aqui para dar entrevista, vim para almoçar. Se é entrevista eu vou embora". E levantei, larguei o almoço, peguei o elevador e fui embora."
Lula afirmou ainda que vai terminar o mandato "sem precisar ter almoçado em nenhum jornal, em nenhuma televisão". "Também nunca faltei com respeito com nenhum deles, já faltaram com respeito comigo. (...) Se dependesse de determinados meios de comunicação, eu teria zero na pesquisa e não 80% de bom e ótimo como nós temos neste país."
O episódio ao qual Lula se referiu ocorreu em 2002, quando ele, então candidato à Presidência, se retirou de um almoço com diretores e editores da Folha na sede do jornal. O petista se irritou com duas perguntas feitas pelo diretor de Redação, Otavio Frias Filho.
Frias Filho perguntou a Lula se ele havia se preparado intelectualmente nos últimos 20 anos para credenciar-se a ocupar a Presidência. O então candidato negou-se a responder a pergunta, alegando que era preconceituosa. O jornalista manifestou estranheza com a recusa.
Pouco depois, o diretor de Redação voltou a interpelar Lula sobre a aliança do PT com o PL, que o jornalista qualificou de linha auxiliar do malufismo. Em meio à resposta de Lula, Frias Filho voltou a questioná-lo, afirmando que sua explicação era evasiva. Nesse momento Lula levantou-se e deixou o encontro, acusando o diretor do jornal de estar a serviço de outra candidatura, numa alusão ao tucano José Serra.

RÉPLICA
Para Frias Filho, "a memória do presidente anda ruim ou ele está distorcendo o episódio de propósito". De acordo com o diretor da Folha, no almoço a que Lula se refere o então candidato "não foi interpelado sobre falar ou não inglês, mas sobre sua política fisiológica de alianças e sobre o fato de ostentar desprezo pelo estudo mesmo depois de se tornar um líder nacional". Frias diz que o incidente foi assim noticiado pela própria Folha no dia seguinte, sem contestação de Lula.



CLÓVIS ROSSI

Lula inventou uma fábula SÃO PAULO - Para não dizer que o presidente Lula mentiu sobre o que aconteceu no almoço de 2002 nesta Folha, em que se sentiu discriminado, digamos que ele contou uma fábula, com escasso parentesco com a realidade.
Para começar, o único presidente norte-americano que frequentou a conversa não foi Bill Clinton, jamais mencionado, ao contrário do que diz Lula, mas Abraham Lincoln. Foi Otavio Frias Filho, diretor de Redação, quem lembrou que Lincoln também não tivera educação superior, o que não impediu que fizesse um bom governo.
Depois dessa observação nada discriminatória, Otavio perguntou por que Lula não se preocupou em estudar mais, depois de ter se estabelecido na vida, como dirigente sindical primeiro e como líder partidário depois.
Lula não respondeu nada, ao contrário da fábula que conta agora. Limitou-se a dizer que se sentia desrespeitado e que, por isso, não responderia. A conversa ainda transitou por outros temas durante um tempo até que Otavio voltou a perguntar, agora sobre a ligação do PT com o fisiologismo.
De novo, Lula não respondeu, a não ser para dizer que não tinha culpa de que não estivesse bem nas pesquisas o candidato do diretor de Redação (do qual não deu o nome). Levantou-se e foi embora.
A reação do então candidato foi tão mais estranha porque, dias antes, Miriam Leitão fizera pergunta parecida e Lula dera uma resposta esperta: nenhuma universidade prepara alguém para ser presidente da República.
O que incomoda nesse episódio não é ele em si, menor. É a fabulação que o presidente faz em torno do que aconteceu. Por acaso, eu estava no almoço e sei perfeitamente o que se disse e o que não se disse. Como posso confiar em que Lula não fabula também ao relatar encontros com políticos ou governantes estrangeiros?

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